Pronto-socorro: ir ou não ir? Eis a questão.

O que é uma emergência, uma urgência ou “dá para esperar a consulta ao pediatra”?

Trânsito maluco, sem horário definido para acontecer, salas de espera superlotadas, pais irritados e angustiados pelo tempo de espera para o atendimento, muitos exames de sangue, urina, radiografias, medicações por boca ou injetáveis, soros aplicados, receitas de altas e ao sair com uma receita na mão a pergunta que não quer calar: Tudo isso era mesmo necessário?

Acompanhem, a seguir, algumas perguntas para avaliar antes de ir, durante a estadia e depois do final dessa aventura em que se transformou a tentativa de resolver um problema de saúde de nossos filhos.

Menina adoentada deitada na cama ao lado de alguns medicamentos - Foto: Ermolaev Alexander/Shutterstock.com

1 – Por que alguns pais preferem levar o filho ao Pronto Socorro ao invés de consultar um pediatra, mesmo que os sintomas não sejam graves?

Muitas razões podem ocasionar essa busca dos pais pelo Pronto Socorro (PS).

A ansiedade por não entender o que está acontecendo com seus filhos e a possibilidade de eles estarem sofrendo de algo mais grave pode desestabilizar os pais que assumem a atitude de resolver o problema agora, já.

Em outras situações, a dificuldade de contato e/ou agendamento de consulta com seus pediatras de confiança também pode ocasionar essa busca.

Além disso, finais de semana e noites, quando o acesso ao pediatra é mais dificultado também pode gerar a ansiedade e a busca do PS. Os pais trabalham e só conseguem ter acesso aos seus filhos no final da tarde, quando normalmente a maioria dos pediatras já está deixando seus consultórios. E isso também aumenta o fluxo desses pais ao PS.

2 – Quando seria realmente necessário levar uma criança ao PS?

De uma forma geral, o pronto socorro deve ser procurado em caso de urgências ou emergências. Ambas são situações de risco, de aparecimento súbito. Enquanto a urgência requer uma solução rápida, em curto prazo, a emergência necessita de solução imediata com risco de morte.

Muitas são as situações que podem requerer avaliação de urgência. Acidentes, traumas, quedas, intoxicações, convulsões, queimaduras, crianças que colocam corpos estranhos em nariz, ouvido, boca, vagina ou ânus, sangramentos pelas fezes, pelos vômitos são algumas dessas situações. Outros quadros que necessitem de medicação intramuscular ou endovenosa, como vômitos, desidratação (moleira funda), dificuldades respiratórias importantes, choro constante, que não para também devem merecer atendimento mais urgente. Em algumas suspeitas de quadros que possam necessitar de intervenção mais imediata a visita ao P.S. pode agilizar alguns exames como nas suspeitas de meningites ou apendicites, por exemplo.

Porém há alguns grupos que merecem atenção especial. Os recém-nascidos (até 30 dias) podem agravar seus quadros muito rapidamente. Assim, pais e cuidadores de bebês até 6 meses de idade devem ter uma observação diferenciada e manter um contato mais próximo com seus pediatras para qualquer alteração.

Um recém-nascido ou bebê que passa a apresentar-se mais apático, com dificuldade respiratória importante, com sucção bem fraca ou até ausente, com sangue nas fezes ou se vomitar em grande quantidade, se ficar roxinho (cianose) ou muito amarelo (recém-nascido com icterícia importante), ou se tiver febre (acima de 37,5) ou queda de temperatura (abaixo de 35,5 / 36º) deve ser examinado e avaliado o mais breve possível.

A febre é um dos sintomas que mais gera corridas ao P.S. Na verdade, a febre é apenas a indicação da presença de uma infecção ou de alguma inflamação. Se a criança está prostrada durante a febre, mas ao normalizar sua temperatura volta a se alimentar e a agir normalmente, não há grande razão para alarme. Porém, uma vez baixada a temperatura, se acriança não reagir, ficar “largadinha”, entre em contato com o pediatra assim que possível. Se não houver chance desse contato, o P.S. mais uma vez pode ser procurado.

3 – E em quais situações deve-se agendar uma visita ao pediatra?

A primeira e principal situação que gera uma consulta ao pediatra seria o acompanhamento de rotina, a puericultura. Essa é a mais importante ação do pediatra: a promoção da saúde e prevenção. Assim, entre 7 e 15 dias de vida recomenda-se a primeira consulta que deve ser mensal no primeiro ano de vida, trimestral no segundo ano de vida. A partir daí, entre os 2 e os 4 anos ela pode ser semestral e daí para frente, pelo menos uma vez por ano até se atingir a adolescência.

Sempre que houver alguma alteração do estado de saúde ou alguma questão que envolva a criança, quer seja no ambiente familiar, escolar, social, o pediatra é o profissional a ser consultado.

4 – Os pais deveriam buscar orientação por telefone com o pediatra antes de agendar uma consulta ou o ideal é que o médico examine a criança?

Pelas características da vida na cidade grande (trânsito, trabalho dos pais, dificuldade de acesso a serviço de saúde), a orientação por telefone ou pela internet pode ser um bom fator de triagem no qual o pediatra orientará a necessidade do deslocamento da criança para um atendimento de urgência em hospitais ou prontos-socorros ou uma avaliação no consultório.

A avaliação clínica nunca será completa sem que o pediatra examine a criança para que assim possa orientar um tratamento adequado, com orientações higiênico-dietéticas e até medicamentosas.

5 – Crianças sempre adoecem de madrugada ou em finais de semana. Como agir?

Um contato com o pediatra sempre é desejável nesse momento, tanto para orientação como para acalmar os pais, mesmo que haja necessidade de uma avaliação de urgência, nesse caso em pronto-atendimento. Caso isso não seja possível ou caso os pais não tenham o acesso ao pediatra, se a criança passar mal de madrugada ela precisa ser examinada. Essa avaliação determinará a necessidade de exames, de medicação, de uma internação ou até de uma cirurgia. Quanto antes é feita essa avaliação, menores são os riscos de complicação e mais favorável a evolução de qualquer uma dessas intervenções.

6 – Se o pediatra não atender ao telefone de madrugada, os pais podem medicar o filho em casa (por exemplo, com um medicamento para controlar dor ou náusea) ou é melhor levar ao PS?

A automedicação, que é uma prática comum no Brasil, deve ser sempre combatida. Um vômito pode ser um princípio de um quadro de gastroenterocolite que pode levar à desidratação ou um primeiro sintoma de uma meningite, por exemplo, que é um quadro muito grave e quanto antes avaliado por um médico terá melhores chances de recuperação. A medicação para a febre (que costuma ter ação analgésica) pode mascarar algum quadro que está em fase inicial (uma apendicite, por exemplo), retardando a suspeita diagnóstica e a intervenção adequada, gerando complicações importantíssimas. Assim, a automedicação e a “auto-desmedicação” devem ser evitadas a todo custo.

7 – Para o hospital, quais são as consequências de receber tantos pacientes com casos não emergenciais?

Quando os serviços de urgência precisam dedicar um tempo a quadros que não são emergenciais acontece um deslocamento de atenção dos quadros mais importantes, mais graves que precisariam ser avaliados de forma mais imediata. Além disso, a espera e a proximidade de crianças mais doentes de outras que estão no P.S. mais pela ansiedade dos pais, pode trazer um desconforto a todos, gerando um aumento da ansiedade e uma exigência maior da equipe de saúde, dificultando a avaliação adequada de cada caso em particular.

8 – E para a criança, existe algum risco em ser exposta sem necessidade ao ambiente do Pronto Socorro?

É evidente que o Pronto Socorro é o ambiente onde se concentram a maior parte dos quadros infectocontagiosos que buscam atendimento e que são transmitidos pela proximidade em qualquer ambiente. No P.S., esse risco é maior. Se não houver essa necessidade tão urgente, é melhor que os pais tentem um contato com seus pediatras que conhecem as crianças e que podem orientar alguma atitude que seja suficiente para que a criança aguarde a consulta de forma segura.

Nem sempre as crianças que vão ao P.S. estão com suas vacinações em dia, com alimentação adequada e isso pode predispor esse grupo a situações de risco.

Além disso, pela rotina de atendimento do P.S. essas crianças são submetidas a mais exames complementares do que os necessários para uma avaliação mais precisa.

Desde 2012, aDra. Magda Carneiro Sampaio, professora titular do Departamento de Pediatria do Instituto da Criança, coordena o “Programa Diagnóstico Amigo da Criança” que visa diminuir a exposição a excessos causados pelos exames complementares. Com essa iniciativa, pretende-se diminuir a quantidade de sangue coletado para a realização de exames (cerca de 75% a 80% a menos) e minimizar a exposição a radiações (cerca de 70% a menos) das crianças, prevenindo assim potenciais problemas nesse tipo de pacientes. E fica claro que, quando levados a um atendimento de Pronto Socorro, essa possibilidade fica bastante dificultada pela eventual necessidade de uma avaliação mais ampla em exames complementares em serviços que não adotam ainda essa postura.

Dr. Moises Chencinski

Formado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo com título de especialista em pediatria pela Associação Médica Brasileira (AM...

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