Hora de Dormir: O Sono – parte 6

Polêmicas: Rotina, livre-demanda e co-leito.

Terminamos a matéria da semana passada com a seguinte promessa:
Na próxima semana vamos mais a fundo nesse tema”.

Então, promessa é dívida (isso é antigo e se fosse verdade de verdade, conheço gente que estaria endividada até a alma após as campanhas… rsrsrs).

Mas eu prometo e tento cumprir e para isso vamos começar… pelo começo (novidade). E vai ser um pouco longo, mas vale a pena pensar sobre isso antes de continuarmos.

Bebê deitado no berço segurando a mão da mamãe - Foto: maxriesgo/ShutterStock

Na semana passada escrevi essa frase:

Ninguém nasce sabendo dormir. Nós criamos rituais de adormecimento. E dormir se aprende desde a infância bem remota”.

Isso significa que diferente do adulto para as crianças a ROTINA é fundamental. Como nos primeiros 3 meses, os ciclos dos bebês são ultradianos e não circadianos (lembra? Volta lá na semana passada).

Então, essa mudança de ritmo precisa ser “ensinada e aprendida”. Caso isso não ocorra, o bebê assumirá que o ritmo ultradiano que ele vem trazendo desde que nasceu deve ser seguido conforme ele cresce. Explicando melhor? Ou alguém explica para o bebê que “nessa casa, se come de dia e se dorme à noite” ou ele vai ter grandes dificuldades em aprender isso por conta própria em pouco tempo.

Para atingirmos esse objetivo é importante falarmos a respeito de três conceitos:

ROTINA, LIVRE-DEMANDA e CO-LEITO.

Olhando assim, sem uma avaliação mais aprofundada, parecem princípios opostos. Vamos ver se são mesmo.

ROTINA

Definição do Michaelis:

sf (fr routine) 1 Caminho habitualmente seguido ou trilhado; caminho já sabido. 2 Hábito de fazer as coisas sempre da mesma maneira, maquinal ou inconscientemente, pela prática, imitação; desídia etc. 3 Hábito inveterado que se opõe a inovações ou progresso. 4 Feitio e espírito conservador. 5 Relutância contra o que é novo. 6 Costume antigo.

Essa definição traz consigo um conceito que é importante para as crianças, mas que é diferente do que se pensa para os adultos, mostrando, mais uma vez, que crianças não são adultos em miniatura.

Uma de nossas funções como pais poderia ser educar nossos filhos, criando hábitos saudáveis que possam levá-los a se transformar em adultos saudáveis, capazes de tomar decisões conscientes e cidadãs e transmiti-las a seus filhos. Mas como fazer isso com bebês?

1 Caminho habitualmente seguido ou trilhado; caminho já sabido. 2 Hábito de fazer as coisas sempre da mesma maneira, maquinal ou inconscientemente, pela prática, imitação; desídia etc.

Quando uma atitude repetida da mesma forma é incorporada, ela se torna um hábito que, a partir daí, segue seu ritmo natural.

Para um adulto, a rotina, muitas vezes, é um fator negativo, de desgaste, de desinteresse, que costuma ser associado à comodidade, à falta de ambição.

3 Hábito inveterado que se opõe a inovações ou progresso. 4 Feitio e espírito conservador. 5 Relutância contra o que é novo. 6 Costume antigo.

Vi 3 frases interessantes sobre rotina:

Seja feliz do jeito que você é, não mude sua rotina pelo o que os outros exigem de você simplesmente viva de acordo com o seu modo de viver” (Bob Marley). Isso vale para todos.

Estou cansada da rotina de me ser” (Clarice Lispector). Essa frase pode ser aplicada à vida de adultos.

Nada prejudica mais uma amizade do que conhecer a rotina intestinal de alguém” (Sheldon Cooper). Para pais e pediatras, essa frase não nos representa. Quanto mais conhecemos toda a rotina de nossos filhos e pacientes, melhor para todos.

Assim, para que se criem hábitos de sono saudáveis e até para corrigir os não saudáveis estabelecer algumas rotinas, algumas condições favoráveis, pode ajudar muito.

LIVRE-DEMANDA

Quando um bebê mama ao seio, quanto ele mama? Se ele mama em um seio até o final ele mama tanto quanto se mamasse nos dois? Como saber se o bebê está com fome? E se ele está saciado?

Toda essa insegurança é gerada pelo fato de o seio não ser transparente nem determinar o volume de leite que tem lá e quanto foi consumido.

Mas se seu bebê mama na mamadeira ou no copinho e você vê quanto ele mama, isso te deixa mais tranquila, não é mesmo? Aí, seu bebê que está habituado a mamar 200 ml, mama 100 ml e larga, você se preocupa, não é verdade? Daqui a 15 minutos ele chora de novo o que você faz? Dá o resto do leite, ele aceita e você fica aliviada. Preciso continuar?

Acho que não, mas eu vou. Como não conseguimos saber quanto o bebê mamou ao seio e as suas mamadas não são sempre regulares nem em intervalos, nem em duração, nem em mamar um ou os dois seios por mamada, como saber se ele está saciado?

Assim surgiu a livre-demanda. Ou melhor, antigamente era sempre em livre-demanda. Em algum momento, se estabeleceu que a criança deveria mamar por um certo tempo em cada mamada e em intervalos regulares. Isso vai acontecer conforme ela cresce, em geral por volta entre os 4 aos 6 meses, quando começa a se estabelecer o ritmo circadiano (se não sabe o que é, veja aparte 5dessa série).

Aos poucos, se estabelece qual a hora de comer mais e a qual a hora de dormir mais. Até os 3 anos de idade a criança precisa dormir à noite e tirar sonecas de dia. Mas ela já não tem mais tanta necessidade de se alimentar na mesma frequência à noite a partir dos 4 a 6 meses e, com a introdução da alimentação complementar, atualmente a partir dos 6 meses, independente do tipo de leite que o lactente receba, a noite passa a ser mais tranquila.

Porém, até que isso aconteça, quem deveria determinar quando e quanto comer deveriam ser a mãe e o bebê. Nome disso? LIVRE-DEMANDA.

CO-LEITO

Ao chegar da maternidade, muitas vezes por insegurança, algumas vezes por ser essa a única possibilidade (um só quarto), outras vezes por comodidade e outras tantas por convicção, o recém-nascido (RN) é colocado em um cestinho, ou no carrinho ou no berço no quarto dos pais.

Bebês gritam, choram, riem, gemem, grunhem, se assustam (reflexo de Moro) em grande parte das vezes dormindo. Em todas essas vezes e nas que o RN acorda, as mães e agora cada vez mais os pais também acordam e vão ver o que tem o bebê. Grande parte das vezes a mãe pega seu bebê e o coloca na cama para amamentar e ao final da mamada, após ele arrotar, ser trocado (sujou ou molhou as fraldas), os pais colocam seu bebê para dormir de volta no berço.

Aí ele chora, grunhe, ri, grita, novamente. Parece que não passou nem meia hora. E algumas vezes não passou mesmo. Ele é trazido novamente para a cama, colocado para mamar, algumas vezes ele aceita, mama pouco, ou muito, e outras vezes não mama, mas se acalma no colo da mãe. Aos poucos, o RN se mostra mais tranquilo na cama, com a mãe, que o aconchega (que delícia, né?) e ele se acalma. E dorme. Quentinho (hummm). E os pais adormecem. E … quando se percebe, estão todos dormindo juntos, na mesma cama.

Acaba ficando mais fácil e parecendo mais natural. A cada vez que o RN acorda de madrugada, a mãe de lado mesmo “tira o seio para fora”, encaixa na boquinha do bebê, ele mama e quando não quer mais ele larga. E dorme. E ela dorme. E eles todos dormem. Até que ele acorda de novo, e de novo e mama de novo e dorme de novo… ou não.

Esse hábito (co-leito com livre demanda) pode se transformar em uma rotina e o bebê irá se adaptar aos poucos com esse estilo de vida. E você pode ou não se adaptar a isso. A questão é que após um tempo, e quanto mais tempo passa, muitas vezes fica mais difícil mudar.

Mas afinal: rotina, livre-demanda e co-leito são bons? Prejudiciais? Importantes? Apresentam riscos? Eu sou a favor ou contra?

A pergunta que eu faço quando uma mãe chega em meu consultório comentando sobre o sono de sua criança, desde RN até os 2 anos de idade (vamos começar por aí), é:

– Avaliando tudo isso que nós conversamos até agora (baseado nas 5 partes da matéria e nessa de hoje), isso te incomoda? Quanto, não financeiramente falando, você estaria disposta a investir em mudanças para modificar o padrão de sono de seu filho?

E ainda digo:

– Não me responda isso agora que nós conversamos, porque a resposta é lógica demais. Vou examinar seu filho, você pensa um pouco mais, e depois vou repetir a pergunta. Aí te conto tudo o que será necessário para uma possível mudança ou adaptação.

Vou deixar essa pergunta no ar para que cada um(a) de vocês pense bem, antes de responder também. Na próxima semana, vamos um pouco mais fundo.

Esse artigo faz parte de uma série, para ver as demais partes, acesse:

Dr. Moises Chencinski

Formado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo com título de especialista em pediatria pela Associação Médica Brasileira (AM...

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