Adaptação na escola em diferentes momentos

Paciência, tolerância e bom-senso podem tornar a adaptação escolar um processo menos traumático

O termo ADAPTAR-SE, se buscado nos dicionários da língua portuguesa será traduzido por acomodar-se, ajustar-se, adequar-se dentre outros. Podemos pensar também em um mimetismo, a harmonia dos animais com o meio, como um camaleão ou uma borboleta. Mas, estes sinônimos não traduzem a intensidade dos sentimentos que se passam nos novos frequentadores da escola, sejam eles de qual idade forem.

Antes de mais nada é imprescindível que tentemos nos colocar no lugar das crianças ou adolescentes e façamos um pequeno exercício de reflexão.

Professora confortando aluno que chora na sala de aula - foto: michaeljung/ShutterStock.com

Imagine-se em um emprego novo, em uma festa ou evento em que esteja sozinho, não conheça ninguém. Como se sentiria? Nós adultos conseguimos explicar, ou até de forma racional compreender esses sentimentos de estranhamento e apesar da situação desagradável, conseguimos superar esses obstáculos e nos adaptar ao novo rapidamente.

As crianças também os superarão, mas é importante que o adulto compreenda o que estão sentindo e as ajude a vencer esta etapa auxiliando-as, encorajando-as, mas não demonstrando compaixão e fazendo cessões. As crianças e adolescentes testam todo o tempo os adultos que as cercam e estes, ao se dobrarem diante de uma frustração, birra ou choro, só reforçam atos inadequados e dão espaço para que se tornem a cada dia mais controladores.

São vários os momentos em que as crianças e adolescentes passarão por adaptações e readaptações escolares.

Ao falarmos de adaptação na escola nos vêm a imagem daquelas crianças de um ou dois aninhos chorando copiosamente. Entretanto, há vários momentos distintos de adaptação e readaptação: bebês, crianças pequenas, maiorzinhas, transições do berçário para a Educação Infantil, da Educação Infantil para o Fundamental I, do Fundamental I para o II, do Fundamental II para o Ensino Médio, mudança de escolas, no meio do processo… Enfim, é preciso que nos coloquemos no lugar deles para podermos auxiliá-los nessas passagens.

Sempre ouvimos: “Nenhuma mudança é fácil!” e para que uma adaptação escolar ocorra da melhor maneira possível, precisa ser bem conduzida, minimizando sofrimentos desnecessários. Quando nos preparamos para as situações, estas acabam sendo menos dolorosas do que se apresentavam. Quanto menor o filho, mais difícil parece a separação e maior a ansiedade dos pais. O bebê não fala e isso provoca nos pais um vazio, pois não têm o registro que gostariam de como foi aquele dia do ponto de vista do bebê. Que bom seria, não é?

Para a escola e seus profissionais também é um momento difícil, pois há que se passar segurança e criar vínculos afetivos, antes de qualquer coisa e é claro que só serão alcançados pouco a pouco.

No mundo contemporâneo, muitos pais acabam por ter um sentimento de culpa por não poderem estar o tempo que julgam ideal com seu filho. Aqui vale a velha máxima “O que importa é a qualidade e não a quantidade do tempo em que passam juntos”. Não há porque se sentirem assim. As crianças crescem, amadurecem e precisam de novas experiências com outros da mesma idade. Por mais longo e cheio de lágrimas, que um período de adaptação possa ser, não traumatiza. Todos superam essas “dores” dos primeiros dias na escola e, logo, eles farão parte de uma lembrança distante.

Essas etapas podem parecer, ou até serem em parte dolorosas, mas aos poucos, pais, crianças e adolescentes passam a conhecer, confiar na escolha que fizeram e a lidar com mais tranquilidade e prazer com essas etapas que são fundamentais na formação e construção da personalidade de qualquer indivíduo.

De casa para o berçário

Há algumas décadas, talvez fosse uma situação inimaginável, mas hoje, muitas mães precisam deixar os filhos ainda bebês na escola e isso não deve ser permeado de culpa ou agonia. É claro que preocupação, insegurança e outros sentimentos passarão pelas noites das mamães e papais, mas ao se fazer uma opção dosada, ponderada e de acordo com o bolso, disponibilidade, filosofia e tudo mais que pais dedicados se informarão, o bebê estará certamente bem assessorado.

Até uns cinco ou seis meses de idade a adaptação é mais dos pais, que não sem razão, ficam apreensivos em ter que delegar os cuidados com seus pequenos a terceiros. O bebê nessa idade pode estranhar a nova rotina, mas ainda não estranha pessoas ao ponto de protestar e, sendo assim, essa transição costuma ser bastante tranquila. Depois dos sete ou oito meses, alguns bebês já estranham e então é preciso atentar para alguns detalhes.

Os cuidadores precisam ser orientados e preparados para compreender as etapas de desenvolvimento neuropsicomotor, o comportamento e cuidados com a assepsia do bebê, fazendo com que o bebê sinta-se acolhido. O espaço deve ser adequado, higienizado e estimulador. A escola precisa permitir que um responsável, permaneça na escola até que se sintam seguros bebê e família para que depois o bebê permaneça sozinho pelo período completo.

Do berçário ou de casa para a creche

Nesta etapa podemos descrever duas diferentes situações. Aqueles que já frequentam o berçário e farão a transição para a creche (0 a 3 anos) e aqueles que farão sua estreia na vida escolar.

Passar daquela vidinha de proteção e cuidados mais que especiais para uma exploração do espaço e relações mais amplas trarão muitas descobertas, alegrias e apreensões.

Os pais de bebês que já frequentam a escola estranham a mudança na rotina e nos cuidados. Via de regra reclamam que a escola relaxou, pois a criança chega cansada, suja, machucada, etc. Na verdade é uma transição saudável, mas difícil de aceitar. Os pais, mesmo que inconscientemente não querem que os bebês cresçam e muitas vezes tentam negociar com a escola uma “prorrogação” no berçário. Os profissionais precisam ser habilidosos e compreender que apesar do bebê já conhecer o espaço e as pessoas, haverá um estranhamento.

O ideal seria que a escola no início disponibilize algum profissional do berçário, que já possui um vínculo com a criança para acompanhá-la na nova turma e em momentos de recreação. No início ainda é importante que a criança faça sua assepsia, alimentação e soninho no berçário, para que só depois, aos poucos, seja feita a transição definitiva. Por outro lado, a nova professora e os novos amiguinhos, podem programar idas diárias ao berçário para começar a criar os primeiros laços e vínculos.

A segunda situação nesta fase é quando o bebê ou criança está entrando na escola por volta dos sete meses até quase três anos de idade, pela primeira vez.

Essa é a idade mais trabalhosa, pois a criança já estranha pessoas e não compreende ainda o que é a escola, o que está fazendo lá e principalmente que os pais continuam a existir mesmo quando não estão diante de sua vista.

É importante também neste caso que a escola permita a permanência da mãe, do pai, avós ou de alguém que a criança tenha um vínculo afetivo para acompanhá-la nos primeiros dias. Essa pessoa deve ficar de preferência em algum espaço que a escola tenha reservado para isso, nunca dentro da sala de aula, enquanto a criança reúne-se com a professora e os novos amiguinhos. Quando a criança sentir-se ansiosa, insegura ou quando chorar deve ser levada ao aconchego desta pessoa para que verifique que não foi abandonada. O familiar deve permitir a aproximação da criança com a professora e com os novos amiguinhos, pois ela precisa fortalecer os vínculos com eles. Se o adulto assumir uma postura superprotetora em lugar de auxiliar, acabará por tornar o processo mais difícil e doloroso.

Pode-se esperar que a criança fique ansiosa, proteste, chore, esbraveje e invente histórias, para evitar enfrentar essa situação. O ambiente familiar e as pessoas que nele habitam já são dominados por ela e isso lhe dá tranquilidade e segurança. Já na escola, encontrará obstáculos e desafios que ela provavelmente não estará com vontade de enfrentar. Ela não precisa clamar por atenção e carinho de seus pais, mas na escola ela precisará sim, conquistar seus espaços e afetos. Lá, as disputas serão leais, não é como com papai, com mamãe ou os vovós que a deixam ganhar no jogo ou fingem que não veem certas transgressões e concedem alguns privilégios só para vê-los contentes e de bem com a vida.

Por mais que os pais estejam apreensivos é importante procurar não passar essa preocupação à criança, mas sim ressaltar os pontos positivos que existirão na sua nova rotina, falando bem da escola, das novidades, dos amigos e brincadeiras. Dorzinhas de barriga, alterações de humor, no sono, manhas e birras são esperadas nesse contexto.

De casa para a escola aos 3 ou 4 anos ou da creche (0 a 3 anos) para a pré-escola (4 e 5 anos)

Este é outro momento de transição ou adaptação. Mas, via de regra é uma situação em que as crianças já compreendem as mudanças, verbalizam e, portanto, costuma ser uma adaptação bem mais fácil. Neste caso um ou dois dias já costumam ser suficientes para que a criança se integre. Esse é o tempo para que elas criem laços, se sintam aceitas, reconheçam os espaços, as pessoas e as novidades.

O professor pode elaborar um planejamento significativo, que promova atividades de integração e se utilize de muita cor, música, água e areia. Assim, será capaz de motivar até a mais sisuda das crianças.

Do pré para o Ensino Fundamental I (do pré para o 1º ano)

Com a nova legislação e o ensino fundamental de nove anos, essa transição está ocorrendo precocemente, aos seis anos de idade.

Um dos maiores erros que se faz nas escolas é considerar o aluno que passa para o ensino fundamental como um mini-adulto. De repente ele deve deixar de ser criança, cria-se uma rotina completamente diferente daquela, que tinha o lúdico como premissa, para uma engessada e, com isso, toda a criatividade, competências e potencialidades são engessadas também. As crianças não deixam de sê-las em um período de férias de verão.

A escola deve compreender a criança como o ser holístico que é e proporcionar a ela um planejamento dinâmico e flexível permitindo que se adapte a nova rotina de uma maneira natural e alicerçada considerados seus conhecimentos prévios, maturação e curiosidade.

A escola pode propor uma carga horária gradativa, mantendo atividades lúdicas como a hora do pátio, histórias, fantoches, dentre outras e aos poucos ir priorizando outras atividades, ano a ano, entretanto sem eliminar o lúdico pois sabe-se que sempre enriquecem qualquer processo educativo.

Do Fundamental I para o Fundamental II (do 5° para o 6º ano)

Nesta etapa, a criança, na verdade um pré-adolescente, passa do contato com poucos professores, que na maior parte das vezes tem uma ligação próxima e afetiva com eles, os conhecem pelos nomes, suas famílias (todos mais afetivos e próximos dos alunos) para um modelo com um professor para cada componente curricular, em aulas de 50 minutos que exigem um ritmo mais rápido de aprendizagem. A entrada na pré-adolescência, também implica em muitas mudanças. Esperar que seja uma transição tranquila seria utopia.

Todavia, é possível se minimizar as ansiedades e transformações se a escola pensar nessa etapa com a devida antecedência.

A escola pode, por exemplo, inserir um novo professor a cada ano, trocando-se 2 professores regentes para inverter disciplinas, por exemplo, para que os alunos comecem a trabalhar com a diversidade de estilos e exigências.

Outra ação positiva é fazer um planejamento interdisciplinar. Uma das maiores dificuldades para os alunos que ingressam nessa fase é a quantidade enorme de exigências em cada componente curricular, desproporcional ao que estavam até então acostumados. Os professores, via de regra, não se conversam e acabam exigindo uma carga grande de trabalhos, pesquisas e lições de casa sem se preocuparem em saber se nos outros componentes curriculares outros professores também já não solicitaram um volume grande de compromissos para o mesmo período. Essa questão pode ser facilmente solucionada com reuniões de nível e uma agenda mensal fixada na sala. Desta forma um professor poderá consultar o que os outros solicitaram e rever e remanejar suas próprias solicitações.

E daí por diante estaremos sempre em novos processos adaptativos: do Ensino Fundamental II para o Ensino Médio, deste para a graduação, para a pós, para o mestrado, para o doutorado, para o pós-doutorado, para o trabalho e para a vida, que se bem conduzidos só nos farão seres humanos holísticos, íntegros e cidadãos prontos para os novos desafios.

Karen Kaufmann Sacchetto

Mestre em Distúrbios do Desenvolvimento;Especialista em Distúrbios de Aprendizagem;Psicopedagoga;Pedagoga;Consultoria pedagógica e Tutoria ed...

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